Imagine um mundo compartilhado. Imagine um mundo de convívio intenso. Um mundo onde sempre há alguém por perto. Onde a sua realidade não é só sua, é sempre de mais alguém. Pois bem. O mundo que imaginaste é o pesadelo dos individualistas.E veja só: ele é real.
Há uma constante necessidade de um “nós”, um apelo insuportável por dividir seu mundo com alguém. Para quem é individualista, isso é aterrorizante. E, sob outro ponto de vista, é deprimente. Para fins de entendimento, vamos chamar as pessoas que vivem nesse mundo, o criam e por ele sentem apreço de “coletivistas”, o extremo oposto dos individualistas. Se for feita uma análise mais profunda a um coletivista, chegar-se-á a identificação de uma estrutura psicológica abalada, (na maioria dos casos).
A linha de pensamento é a seguinte: quanto mais precisa-se da companhia de outros e condiciona-se a esta companhia a felicidade, menos o indivíduo sente-se seguro em sua própria companhia e seguro de suas próprias ideias e convicções. Por certo pode haver indivíduos seguros demais, mais aí o abalo residirá no extremo narcisismo e necessidade de aprovação, que uma segunda análise revelará novamente a insegurança e a visão deturpada de mundo, antes mencionada.
A pessoa que possui autocompreensão, auto-aceitação e uma visão do outro como ser uno não será dependente desse convívio intenso que é imposto. A autocompreensão permite que o indivíduo entenda seus sentimentos e pensamentos, perdendo o temor e a apreensão que estes podem causar. Já a auto-aceitação funciona como complemento. Aquele que aceita todas as partes que o compõem, previamente compreendidas, não viverá em conflito interno. É importante que não se confunda autoaceitação com conformismo: este impede que se mude o que não é apreciado, aquela permite que se mude, mantém o espaço para mudança aberto, muito embora não obrigue à mudança.
Por último e talvez mais importante, a visão do outro como ser uno. Quando se pensa e percebe o outro como ser uno, único e independente, é eliminada a necessidade absurda de compartilhamento. Vendo a cada um como indivíduo, e não apenas como parte de uma sociedade da qual também se é membro, a visão do universo único que compõe cada pessoa é facilitada, bem como o respeito a este universo.
A partir dessas premissas, pode-se chegar a um relacionamento interpessoal ideal: cada qual com a sua individualidade e o seu microcosmos preservado, com pontos de contato estimulados, sem relações de dependência e criação de expectativas exageradas. Consequentemente, também sem condenações e decepções incontáveis.
Observe-se que não há nesse ponto de vista nenhuma negação da importância do convívio, ou da premissa de que “o homem é um ser social”. É exatamente o contrário: apenas o individualismo pode levar à convivência prazerosa e à relação social por excelência, recíproca, porque despe a relação social do caráter de dependência, e obrigatoriedade.
O individualismo é a desconstrução da alienação, do estranhamento daquilo que se é e faz, e daqueles com quem se escolhe conviver. É o protesto ao meio de vida onde a única coisa tornada comum é também tornada alheia: o íntimo do ser humano.
Faça-se dessas poucas linhas um manifesto pelo individualismo. Por um mundo onde se permita o silêncio e seja ofertada a possibilidade de não compartilhar. Por um mundo onde o individualista não seja condenado à viver todos os dias seu maior pesadelo para satisfazer a demência de uma sociedade em que a propriedade é privada e o sujeito é coletivo.
PS.: Os conceitos de individualismo e coletivismo que usei NÃO se expandem à este coletivismo ou este individualismo. É só, só o que realmente está no texto, ou só no sentido em que foram usados.
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