quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Convicções e Contradições

Cada convicção férrea, árdua, nos levará a uma contradição, cedo ou tarde. 
Nossos olhos não nos propiciam uma visão completa das coisas, nossa mente não permite que julguemos com total imparcialidade. Isso nos levará a mudar de opinião frequentemente. E sou adepta daquela velha máxima: Só não muda de opinião quem não a tem.  
Para ilustrar: escrevi na semana passada (com muita convicção, diga-se de passagem) uma nova postagem, sobre o que é considerado diversão pelos jovens de hoje. Nele, critiquei abertamente as festas com música alta, bebida, gente dançando como se o mundo fosse acabar. No sábado, numa janta de amigos muito especiais, fui obrigada a rever meus conceitos. Porque eu mesma estava num ambiente assim (retirando a bebida, que, continuo convicta nesse ponto, não é necessária para divertir-se) e confesso que me diverti muito. Apoio totalmente quem diz que jovens devem se divertir, mas continuo discordando daqueles que fazem disso a única razão para se viver. 
As certezas nos levam sempre a conclusões precipitadas. Prefiro partir do pressuposto que tudo é mutável e inconstante, inclusive eu mesma. Dessa forma, estarei garantindo a ponderação e o equilíbrio entre extremos. 
Não estou afirmando aqui que não me posiciono e fico em cima do muro, pelo contrário. Adoro ter opinião e adoro expor minha opinião. Mas é preciso moderação, pois esse instrumento contém um poder que mal conseguimos dimensionar. Como diz Alexandre Herculano, "Eu não me envergonho de corrigir os meus erros e mudar de opinião, porque não me envergonho de raciocinar e aprender". 
Cair em contradição por uma convicção não é vergonhoso. A vergonha é não admitir a contradição e não flexionar a opinião por vaidade. 

domingo, 12 de setembro de 2010

Duras, ásperas... Tênues e Sutis

Como seres humanos, estamos frequentemente interagindo com aqueles que nos rodeiam. As maneiras podem ser as mais diversas. Mas, hoje, em oposição ao meu post anterior, me propus a falar delas, que preenchem nossos silêncios: as palavras.
Falamos. Tanto. Nosso fluxo de palavras é constante, e não raro nos surpreendemos falando palavras cujo significado não conhecemos, ou não condiz com o que realmente queremos dizer. Mas o contrário também ocorre. Deixamos escapar palavras que nos revelam, que nos condenam. Para um ouvinte atento e observador, ficamos completamente expostos por nossas palavras, pela forma como são ditas, ou mesmo não ditas.
As palavras que mais falamos, ou mais calamos, nos deixam nus. Revelam tudo que sentimos, aquilo que escondemos, inclusive de nós mesmos. Repetimos as palavras, inconscientemente, que mais demonstram nosso estado de espírito.
E essas palavras tem poder. Não vou repetir frases feitas nem ditar fórmulas mágicas de atração e conquista. Mas, sabemos claramente, manter nossos pensamentos positivos, confiantes e com fé, funciona. O contrário também.
Entretanto, quero falar do poder das palavras que todos, eu disse TODOS já sentiram. Elas ferem. Magoam, dilaceram. Quando ditas por impulso, podem abrir feridas incuráveis. Claro que em quem escuta, mas nem tão claramente em quem as profere. Decidimos nossas vidas incitados por vontades e sentimentos passageiros. E, em um instante, mudamos nosso rumo e o de outras pessoas.
Devido a meras palavras, ditas no calor de um momento, nos arrependemos e sofremos durante um tempo que nos parece infindável.
Palavras ferem, maculam. Mas saram e cicatrizam. São remédio e veneno. Às vezes ao mesmo tempo. às vezes destroem quem as diz e curam quem as ouve, ou vice-versa.
A verdade é que as palavras tem mais importância do que imaginamos. E pensar antes de proferi-las pode ser um bem. Ou não. Nossas intuições e impulsos são algo maravilhoso, que não devemos reprimir, mas dosar e refletir. Dosar na hora, e refletir depois.
Seria, enfim, incorrer em erro torturar-nos por palavras, por maior que seja o seu poder. A consciência tranquila, nesse campo, é o que nos garante a certeza de ter usado e continuar usando de forma edificante e matizada de amor, esse instrumento de influência, decisão e realização que temos na ponta de nossa língua, de nossos dedos e no brilho de nossos olhos: as palavras.

sábado, 11 de setembro de 2010

O Conteúdo do Silêncio

Em uma sociedade neurótica, com valores distorcidos, cada vez mais as pessoas buscam o tão sonhado silêncio.
O único problema consiste em encontrá-lo. O que acontece é que a ansiedade, a compulsão por falar, comer melhor... enfim, seja o que for, está levando as pessoas a perderem a saúde e de quebra a sanidade.
É importante salientar que esse "silêncio" não existe. Este silêncio é a paz de espírito.
Porém, nosso objetivo aqui não é reclamar da sociedade ou das pessoas, e sim mostrar-lhes um rumo melhor. 
Ainda nesse ritmo, o silêncio que existe pode ser dividido em duas categorias: o acolhedor e o destrutivo.
A respeito do silêncio acolhedor, conhecido por tão poucas pessoas e apreciado por um número muito menor, poderíamos dizer muitas coisas. Geralmente, no silêncio acolhedor, estejamos nós sozinhos ou acompanhados, ocorrem aqueles momentos de mergulho profundo em nossos sentimentos, nossas ideias e aspirações reais. Saímos deles nos conhecendo melhor e sendo capazes de evoluirmos e desenvolvermos completamente nossos potenciais. O silêncio acolhedor, quando não solitário, pode ser fonte de satisfação real e plena. Esse silêncio geralmente ocorre quando estamos em companhia de alguém em quem confiamos, alguém com quem possuímos um nível de familiaridade mais elevado. É quando nos sentimos protegidos e acolhidos. E quando paramos pra pensar, ou mais claramente, quando paramos pra viver um silêncio assim? 
O silêncio destrutivo nos constrange, é indiscreto e destrutivo. Geralmente, é quando calamos para repreender, quando o melhor seria expressar aquilo que nos vai na alma. Por exemplo, o silêncio após expressarmos opiniões com a qual a grande maioria não concorda. Em casos assim, um debate sereno seria muito mais produtivo que um silêncio que censura e mantém na ignorância. O fato é que temos muitos mais lembranças deste tipo de silêncio do que daquele que nos ampara. 
Precisamos, como seres humanos, tentar reencontrar este carinho que muitas vezes apenas o silêncio pode nos proporcionar, buscar esta paz tão esquecida em nosso caótico cotidiano.
O silêncio de cada um, seja qual for o que você procura, está em você mesmo. Nossas vidas parecem parecem querer terminar no instante seguinte. Mas não vão. Não planeje o futuro com tantos detalhes, tenha consciência do seu corpo no agora, escute boas músicas, tenha uma vida feliz apesar das adversidades, não esqueça de descansar e AME MUITO!


Um forte abraço! Muita Paz, Luz, Amor e Bênção!!
Yuri Wladimir Pitthan e Kássia Castoldi Ficagna




A ideia deste texto surgiu "por acaso", como "por acaso" surgiu nossa amizade, mas não é por acaso que permanece. Vou aproveitar esse pequeno espaço pra umas poucas linhas de homenagem pra este amigo que me honra com sua amizade e alegra em todos os momentos. Obrigada, Yuri, pela presença, pelos conselhos, pelo carinho, pelas palavras. E pelo silêncio. ♥

domingo, 5 de setembro de 2010

Kiss - I Still Love You

Video que fala tudo...

 I Still Love You



You tell me that you're leaving, and I'm trying to understand
I had myself believing I could take it like a man
But if you gotta go, then you gotta know that's killing me
And all the things I never seem to show, I gotta make you see
Girl it's been so long, (now, tell me) tell me how could it be
One of us knows the two of us don't belong in each others company
It hurts so much inside, you're telling me goodbye, you wanna be free
And knowin' that you're gone and leavin' me behind
I gotta make you see, I gotta make you see, I gotta make you see
That I still love you, I love you
I really, I really love you, I still love you
Now, people tell me I should win by any cost
But now I see as the smoke clears away, the battle has been lost
I see it in your eyes, you never have to lie, I'm out of your life
Tonight I'll dream a way that you can still be mine
But I'm dreamin' a lie, dreamin' a lie, makes me wanna die
'Cause I still love you, I love you
Baby, baby I love you, I still love you
And when I think of all the things you'll never know
There's so much left to say
'Cos girl, now I see the price of losing you will be my half to pay
My half to pay, each and every day, hear what I say
I still love, I still love you
I really, I really love you, I still love you
Baby, baby, I love you, I love you, I really, I really love you

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Angenor de Oliveira - Cartola

Cartola nasceu a 11 de outubro de 1908 no Rio de Janeiro, em um bairro chamado Catete, onde passou a infância atendendo pelo nome de Angenor de Oliveira. Aos 11 anos, início de sua adolescência, mudou-se para o Buraco Quente (bairro do morro da Mangueira).
Aos 17 anos, já era o típico "malandro carioca", e fundou juntamente com seus amigos e companheiros de samba a GRES Estação Primeira de Mangueira. Compôs o primeiro samba enredo da escola, com o qual a Mangueira venceu o seu primeiro carnaval, As cores verde e rosa que representam a Mangueira foram uma escolha sua. Para aqueles que protestavam dizendo que as cores não combinavam, Cartola respondia: "Ora, o verde representa a esperança e o rosa o amor, como o amor pode não combinar com a esperança?" 
Devido ao racismo, Cartola nunca foi economicamente bem sucedido. Vendeu sambas no início de sua carreira e teve diversas profissões, entre elas escrivão e pedreiro. Foi na profissão de pedreiro que recebeu o apelido de Cartola, pois devido a sua vaidade usava sempre um chapéu côco para não sujar os cabelos de cimento.
Teve um sumiço temporário entre as décadas de 40 e 60, onde assumiu inúmeros "papeis". Na metade dos anos 60, o jornalista Stanislau Ponte Preta encontrou-o lavando carros no bairro de Ipanema e perguntou: "Você não é o Cartola?" "Sou", foi a resposta. Isso causou muito espanto ao jornalista, que passou a ajudá-lo, tornando-o mais popular. Ele reuniu Cartola e grandes  nomes da Literatura Brasileira e lançaram o seu primeiro disco em 1974.
Entre seus amigos estavam Donga, que "criou" o maxixe na década de 20, e Carlos Cachaça, grande poeta e compositor de Samba.
Nos anos 40, casou-se com Dona Zica antiga vizinha da infância. Dois dias antes de seu casamento, compôs para ela a música "Nós Dois". Teve muitos filhos, dos quais a maioria e também alguns netos continuaram "cultuando" o Samba.
apesar de ter apenas o primário, compôs as mais lindas canções do Samba, entre elas "Chega de saudade" e "As rosas não falam".
Também na década de 60, fundou juntamente com Zica, o bar ZiCartola, que foi um pólo irradiador do Samba.
Nos anos 70, mudou-se da Mangueira para uma casa em Jacarepaguá, na Rua dos Andrades, onde fica a estação do metrô.
Angenor de Oliveira, o Cartola, morreu pobre em uma casa doada pela prefeitura do Rio de Janeiro.
É admirado e considerado por nomes famosos da música, como Nelson do Cavaquinho e Paulinho da Viola como o maior sambista se todos os tempos. Ainda na época em que estava vivo, mestres da música, como Villa Lobos e Stokovsky foram visitá-lo no Buraco Quente. Cartola certamente deixa saudades no seu centenário.


"Cartola não existiu, foi um sonho que a gente teve"
Nelson Sargento

(Compilação de trechos retirados da Internet. Muita coisa saiu daqui: http://brazilianmusic.com/cartola/indexp.html)

Cartola foi um homem à frente do seu tempo. Apesar de ser um homem genial, o reconhecimento merecido nunca foi devidamente alcançado. Acima de tudo isso, o menino simples que teve sua condição econômica drasticamente alterada na pré-adolescência nunca deixou de lutar e conservou a humildade. Cartola tem muito a ensinar para cada um de nós. A fidelidade dos amigos, que se mantém até hoje, pode ser tomada como reflexo do coração simples e lotado de coisas boas, cativante como poucos. Homem de talento que dispensava homenagens póstumas, tem hoje no carinho de pessoas que nem sequer conheceu a maior prova que o seu talento e musicalidade não foram empregados à-toa. Também não é à-toa que é considerado o maior sambista de todos os tempos. Com canções sempre atuais, cativou o coração do público. Dificilmente o Brasil vai ter novamente um artista com sua genialidade e humildade. 
Cartola... Não é sem motivo que hoje seu centenário é comemorado, e nosso coração se enche de orgulho e carinho ao lembrar de uma personalidade tão cativante.




(Texto escrito no ano de 2008, devido ao Centenário de Nascimento de Cartola.)

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Panis Et Circensis Brasileiro

A cultura brasileira destaca-se no cenário mundial como uma cultura de alegria e irreverência impressionante. Como símbolo dessa cultura, podemos citar o Carnaval, festa tipicamente brasileira e alegre como poucas no mundo. Os desfiles das escolas de samba pelas avenidas no Brasil afora nos traz diversas reflexões, desde o tema abordado nos sambas enredo até os custos dos majestosos carros alegóricos.
Como uma festa que celebra a alegria, o Carnaval tem diversos aspectos positivos. É indiscutível que o povo brasileiro encontra no Carnaval uma fonte de alegria, celebrando a própria. Porém, muitas vezes isto mascara problemas reais e insolúveis.
A grande maioria da população, principalmente das camadas mais humildes dedica todo seu potencial criativo, que poderia ser melhor aproveitado em tarefas sociais, na concretização dessa comemoração. O Estado também tem uma grande participação na festa popular, com verbas e incentivos.
É absolutamente inaceitável que num país carente, subdesenvolvido, necessitado de tanto e de tudo, continue-se a empregar milhões e milhões em fantasias e carros alegóricos durante uma semana. Nesse ínterim, milhares de pessoas morrem num sistema de saúde precário, crianças sofrem em meio a uma pseudoeducação deficiente e a falta de emprego humilha e acaba com a dignidade do cidadão.
Essa política, de dar ao povo o que o povo pede, a alegria que se espera, mesmo que durante uma única semana, é tão antiga quanto o próprio Carnaval. Os políticos romanos a usavam enquanto o povo perdia suas vidas e desperdiçava tempo. Hoje, ainda é utilizada para maquilar a realidade deprimente e passar ao mundo uma imagem de um povo satisfeito e feliz. Enquanto isso, o povo assiste sorrindo o desfile da hipocrisia e da mentira na Sapucaí, realizando-se entre plumas e paetês, mesmo que não passemos de analfabetos funcionais, mesmo que o feijão e o arroz não cheguem à nossas mesas.


Texto escrito em julho de 2010 para avaliação escolar. 

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

A Internet na Mídia

O cotidiano do homem moderno é cada vez mais cômodo, mais confortável, mas também muito mais isolado e sedentário. Entre as diversas ferramentas tecnológicas que contribuíram para esta situação está a Internet, com as inúmeras possibilidades que temos em mãos com um computador conectado à rede mundial. Aliando ferramenta de trabalho com passatempo popular, a Internet é atualmente presença na maioria das residências brasileiras. Em grande evidência na mídia, a mídia também é facilmente encontrada em suas páginas.
Pode-se afirmar que a Internet é um veículo de comunicação muito mais abrangente em termos de assunto do que os demais, apesar do alcance da televisão, por enquanto, ser mais alto. A variedade de conteúdo em seus sites abrange seguramente todos os assuntos do interesse humano. Consequentemente, teremos seres humanos com intenções as mais variadas utilizando-se dos serviços desta rede, principalmente para o potencial de contato humano que ela nos oferece.
Não é esta, porém, a visão que a mídia televisiva nos transmite a todo instante. As notícias mais comuns envolvendo o mundo virtual provem de crimes, como fraudes e pedofilia. Somos condicionados a acreditar que toda e qualquer pessoa que entrar em contato conosco na Internet é desonesta, e seremos vítimas de fraudes e outros crimes a cada clique. Porém, não chega a nosso conhecimento fatos triviais que o conhecimento direto desta ferramenta nos transmite: amizades e amores sinceros que nascem ou se mantem virtualmente, conhecimentos expandidos e difundidos, como muitas outras maravilhas, impossíveis há quinze anos, mas hoje consideradas banalidades.
É claramente visível o interesse da mídia em manter a população longe de fontes de cultura facilmente acessíveis, pois quem tem acesso a pontos de vistas diferentes tem material para formular opiniões próprias. Num país onde informações são escolhidas a dedo por interesses pessoais, opiniões concretas e embasadas serão desprezadas, e um veículo de informação se tornará um perigo em potencial, até o momento em que o discernimento criar opiniões fortes o suficiente para elucidar conceitos falhos.


Texto escrito em 06/05/2010, para avaliação escolar.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Os tomates estão passados...

Aquele era dia de feira para Maria das Graças e Lourdes. Cada uma pegou seu carrinho e foram conversando alegremente durante todo o caminho até o parque onde a feira era realizada. Lourdes notou algo estranho na amiga, mas resolveu não dar bola.
Enquanto escolhiam as laranjas, o assunto principal era a filha da vizinha que aparecera grávida. 
- Mas ô, Lourdes, a menina tem só dezesseis anos! - E virando-se para o vendedor - São fresquinhas essas laranjas, seu Valdomiro? ?
E a voz de Lourdes abafou a resposta:
- Pois é, Das Graças! E "tão" dizendo lá no Posto de Saúde, ouvi ontem, que ela não sabe nem quem é o pai!
- E para o verdureiro - Me vê meio "quilo" dessas laranjas aqui, não as mais maduras, que eu não quero não. Aquelas ali da caixa que "tão" no ponto.
- E "vê" pra mim umas quinhentas gramas, que vai ter visita lá em casa e eu "tô" pensando em fazer um creme de laranjas.
Passaram pela banca dos caquis sem nem olhar, achando absurdo o preço da alface e passaram reto também por esta banca. Enquanto falavam, Maria das Graças tinha o pensamento longe, e Lourdes não pode deixar de notar. Lá pela metade da feira, a curiosidade venceu Lourdes.
- Das Graças, você "tá" bem mesmo? 
Os olhos de Maria das Graças ficaram marejados e ela deu um sorriso melancólico à amiga.
- Ah, Lourdes, amiga! Não esperava que você fosse notar! Eu "tô" com tantos problemas em casa...
Os tomates ficaram esquecidos quando Lourdes resolveu consolar Maria das Gtraças.
- Mulher, não se abale! Pode desabafar... Vai, me conta tudo.
Sem perceber, Maria das Graças colocava aleatoriamente tomates na sacola e de volta a banca, mania compartilhada por Lourdes.
- Sabe o que é... Achei um lenço manchado de batom no bolso da calça do Gilmar...
-Ahhh, que desgraaaaçaa... Batom de que cor?
- Batom vermelho, Lourdinha! 
- Ah, meu pai eterno! O caso é grave, hein!
Alguns tomates rolaram pelo chão e o dono da banca resmungou algo, mas nenhuma das duas ouviu. 
- E o pior é que eu fui tirar satisfação com o Gilmar e ele disse que "tava" apaixonado e queria a separação!
Foi a vez de Lourdes largar os tomates e então cobrir a boca com as mãos.
- Por Deus, Pai Santo!
- Pois é, menina... E a Rosinha, tá revoltada... "Tá" querendo largar a escola, anda recebendo telefonemas estranhos de homens querendo marcar encontros... 
Lourdes ajuntou os tomates.
- E o que ela diz de tudo isso? 
- Ela não diz nada... Mas ouvi umas conversas dela e... - Maria das Graças desatou a chorar - eu acho que minha filha "tá" se prostituindo, Lourdes!
Mais uma vez, Lourdes cobriu a boca com as mãos.
- Menina, mas que zica você "tá", hein!
Remexendo as alças da bolsa, Maria das Graças continuou, tristonha.
-E o Juninho, garota! Meu menino passa a noite fora de casa, e dorme o dia todo! Achei uns cigarros estranhos nas coisas dele... Parecia maconha... 
Lourdes já estava perdendo o interesse agora escolhia tomates com mais atenção que ouvia a amiga.
- Menina, procura um pai-de-santo, uma benzedeira! Isso só pode ser olho gordo!
Maria das Graças chorava. Continuou desabafando com Lourdes, enquanto percorriam a feira. Já Lourdes, ia em silêncio, fazendo comentários oportunos e dando conselhos aparentemente excelentes, mas completamente vazios de interesse e vontade de ajudar. Seu único interesse no momento era o que preparar no almoço. 
Ao fim da feira, dirigiram-se para casa. Em uma certa esquina, Maria das Graças abraçou Lourdes afetuosamente.
- Como é bom ter uma amiga interessada como você! Obrigada, sei que posso confiar em você!
E então se separaram.

Lourdes chegou em casa, desembrulhou as compras da feira e examinou os tomates.
- Mas como sou boba! Escolhi tomates passados por causa das chorumelas da Das Graças!
Então, relembrou as coisas que a amiga contou e correu ao telefone.
- Dejanira? Sabe quem encontrei hoje na feira? A Das Graças, ela... 
A conversa se estendeu por horas

Na próxima feira, o assunto era Maria das Graças, seu marido infiel, seu filho drogado e sua filha prostituta.


Texto escrito no primeiro semestre de 2009, para avaliação escolar.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Depois do Fim

A noite estava quieta. Nenhum rumor na rua deserta.
Abri meus olhos. Só conseguia enxergar o brilho difuso das estrelas, muito longe de mim.
O que havia acontecido? Quem eu realmente era?
Aos poucos, as lembranças foram voltando... Aos poucos, eu fui recobrando os sentidos. 
Eu estava caminhando pela rua... Investigando mais um desses crimes aparentemente sem solução. Estava feliz... Exultante, quase eufórico. Acabava de descobrir a solução de um mistério insolúvel. Quem roubara as jóias da condessa fora a sua antiga camareira e ama-de-leite. 
Corria em direção da delegacia, apresentar a denúncia oficial e depois iria até o palácio da Condessa oferecer a solução do crime.
E...Então...
EU NÃO CONSIGO LEMBRAR!
Essa dor me torturava! Parecia que alguém martelava em minha cabeça com um martelo de ferro, sem piedade...
Vamos... Apenas um pouco mais de esforço...
Então... Um vulto... Sim, um vulto masculino... Passos abafados... Uma voz cruel... Uma mão fria em meu pescoço... E... Uma pancada seca em minha cabeça...
Em seguida... O silêncio, a ausência total de ruídos... A falta de dor... A luz... E o vazio...
Nada mais.
Vi minha vida passar toda em minha frente.
Os primeiros passos... O primeiro dia de aula!
A primeira namorada... O dia do meu casamento... O nascimento de meu primeiro filho...
Senti meu rosto se iluminar em um sorriso... Mas... Ah, a dor!
Vi minha esposa deitada em seu caixão... Nosso filho chorando de fome... Meu primeiro assalto... Mas foi por um bom motivo, MEU FILHO TINHA FOME! Desespero... E... Quando fui pego... Me pegaram roubando o leite para sua refeição.
E o acordo.
A polícia perdoaria meus erros se eu trabalhasse para eles, Me acovardei. Aceitei. Errei.
Tentaram me corromper. Eu deixei. E vi cada suborno passar na frente de meus olhos. 
As lágrimas agora molhavam meu rosto em intensidade muito maior do que a chuva abençoada lavando as imundas sarjetas onde me encontrava caído.
E.. O declínio... O fracasso.. As bebedeiras... Poucos casos me eram entregues...
E essa era minha chance. Minha chance de ter novamente prestígio. 
Bastava entregar a camareira.
Mas...
A pobre mulher não tinha culpa! Eu não poderia culpar uma inocente!
Então, revi tudo o que sabia sobre o caso. E a solução foi tão fácil, tão óbvia! Fora o amante. Mas ele era extremamente rico e influente... 
Não importava. Eu o entregaria.
E... A voz.
Dizendo que eu já suportara o bastante. Ganharia uma chance, última e única, de fazer a coisa certa. 
E eu vou, Vou sair dessa sarjeta. Cumprir meu dever. Aí então poderei. 
Ah... Poderei novamente olhar sem culpa para os olhos de meu filho.


Texto escrito em 13/05/2008 para avaliação escolar.